Entrevista: Wrana Panizzi, vice-presidente do CNPq

Publicado em: 27 de setembro de 2010 13h09min / Atualizado em: 17 de março de 2017 16h03min

A professora Wrana Panizzi, vice-presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), foi convidada para palestrar na abertura da fase final da I Coepe, na noite do dia 02 de setembro. Antes do evento, a dirigente falou para o Boletim da UFFS sobre vários assuntos relacionados ao contexto da pesquisa científica e tecnológica no Brasil. Confira abaixo suas considerações.

UFFS – Como o CNPq se insere hoje no contexto das agências financiadoras de pesquisa no Brasil?

Wrana: Acho que podemos dizer que estamos progredindo bastante em pesquisa tecnológica e científica em nosso país. É claro que isso não começou ontem, nós temos uma história muito vinculada a fundação das primeiras agências e o início da construção de uma política científica e tecnológica que começou ainda na década de 1950. Por exemplo, o CNPq começou em 1951 e completa no próximo ano 60 anos de atividades. E esta política cresce no contexto dos últimos anos 50 anos, onde em todo o mundo tivemos um maior desenvolvimento nestas áreas. Foi uma política construída entre momentos de altos e baixos, mas hoje temos uma maior institucionalidade, um conjunto de órgãos de apoio vinculadas a diferentes áreas, a diferentes ministérios. Temos, por exemplo, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, coordenado pelo presidente da República, o qual está em pleno funcionamento e que reúne representantes de diferentes ministérios, de diferentes instâncias de representação social e também representantes das diferentes entidades produtoras de conhecimento. No momento temos a possibilidade de dizer que vivemos um bom tempo, um tempo de estabilidade institucional, uma estabilidade com crescimento de recursos e a consolidação de grupos de pesquisa nas mais diferentes áreas do conhecimento. Contamos com uma diversidade de instrumentos que vai desde o apoio ao estudante do ensino médio, ao ensino de graduação, passando pelo mestrado e doutorado, e também chegando à consolidação dos grupos na fronteira do conhecimento. Enfim, podemos dizer que temos uma pesquisa internacionalizada e competitiva, e também que possuímos um conjunto de recursos humanos altamente qualificado, fruto de uma política de formação levado a cabo pelo CNPq e Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior).

UFFS – E como está o Brasil em termos internacionais?

Wrana – Atualmente formamos 12 mil doutores a cada ano e quase 40 mil mestres. Então acho que isso nos permite ter apoio a diferentes projetos e aos inúmeros editais que atendam os mais diferentes níveis de pesquisadores. Podemos dizer, também, que não crescemos apenas em formação de recursos humanos, mas também em termos de produção científica e produção de artigos internacionais, passando do 15º para o 13º lugar. Temos uma produção mais equilibrada, falando de igual para igual com os países de maior produção científica do mundo. É claro que precisamos crescer muito mais, pois sem dúvida a pesquisa científica trata da produção do conhecimento, e isso hoje se constitui no bem maior, aquele bem que agrega valor às coisas materiais e também às pessoas. Agrega valor individual e em termos coletivos, cresce o cidadão e cresce a nação quando nós temos a possibilidade de ter uma maior produção de conhecimento.

UFFS – Quais as mudanças que a pesquisa científica vêm sofrendo nos últimos anos? O CNPq vive alguma sinalização neste caminho?

Wrana – Tenho impressão que não é só uma visão do CNPq. Essa é uma percepção acompanhada pelas demais instituições de que o conhecimento não se produz mais da forma que até então nós tínhamos, fruto do trabalho de um grande pesquisador, de uma pessoa que se dedicava uma vida inteira e que trabalhava em torno de uma determinada questão. Hoje nós trabalhamos muito mais o conhecimento de forma interdisciplinar, portanto, ele requer conhecimentos e aportes de diferentes áreas e se dá muito mais em redes, sejam pesquisadores das mesmas áreas ou com pesquisadores de diferentes regiões, que se associam e possibilatam uma maior interlocução, até mesmo em âmbito internacional. Então acho que o CNPq começa a perceber isso e hoje nós temos instrumentos como os Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs), em número de 123 situados nos mais diversos locais do território nacional. Estes institutos estão em quase todos os estados e não só no Centro-sul e Sudeste, numa espécie de enraizamento atingido o chamado “Brasil profundo”.

UFFS – Existem alguns projetos do CNPq direcionados às universidades criadas mais recentemente, entre elas a UFFS?

Wrana – Atualmente nós temos muitos instrumentos, tanto no CNPq quanto na própria Capes, órgão vinculado ao MEC, como na Funep, vínculado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, os quais buscam uma estratégia levando-se em consideração muito fortemente o desenvolvimento estratégico brasileiro. O desafio é fazer com que as instituições mais tradicionais e consolidadas, que possuem liderança em pesquisa, inclusive em termos internacionais, possam continuar seus pojetos, ao mesmo tempo em que as novas instituições, enraizadas em certas regiões do Brasil, como é o caso da UFFS, que abrange parte dos três estados do Sul, uma região de fronteira importante, também tenham acesso aos recursos necessários. Essas regiões tem uma vitalidade econômica muito forte e que precisam de um apoio, de um aporte de conhecimento, de tecnologia para poder dar mais um passo adiante nesse processo de crescimento, e para isso essas universidades precisam contar com centros formadores de recursos humanos qualificados e centros produtores de conhecimento. Por isso, tanto o CNPq quanto a Capes buscam criar instrumentos que levem em conta esta estratégia: continuar apoiando as instituições já consolidadas e dar condições àquelas em fase de implantação porque certamente estas universidades mais novas não podem percorrer o mesmo caminho que as antigas universidades percorreram, que era em outros tempos, eram décadas em que não tínhamos uma institucionalidade e uma política orgânica tão bem formulada quanto neste momento histórico.

UFFS – Na sua opinião, qual a importância da pesquisa científica e tecnológica para o desenvolvimento de uma determinada região?

Wrana: É um fator determinante. Por isso que as políticas públicas atuais levam este assunto muito em consideração, inclusive com um aporte diferenciado para as regiões Norte, Nordeste e Centro-oeste do Brasil, com 30% dos recursos advindos dos fundos setoriais canalizados para estas regiões. Mas também temos desigualdades intrarregionais, como o caso da região onde está instalada a UFFS. Então nós temos uma vitalidade, mas que não pode se expandir, vitalizar-se num ritmo necessário porque carece deste bem maior que é o conhecimento. Certamente que as universidades têm este papel, e uma política de territorialização é importante. O que chama a atenção de nossa política de desenvolvimento científico e tecnológico é a preocupação com o combate às desigualdades regionais, e isso não vem de agora, é histórico no nosso país mas que precisa encontrar instrumentos efetivos para sua solução.