UFFS: estudo aponta que 87% dos trabalhadores rurais estão expostos a agrotóxicos há mais de 10 anos
A pesquisa foi realizada com 113 agricultores do município de Cerro Largo

Publicado em: 14 de agosto de 2017 11h08min / Atualizado em: 14 de agosto de 2017 11h08min

Uma pesquisa realizada com 113 trabalhadores rurais do município de Cerro Largo apontou que a exposição a agrotóxicos está presente predominantemente em agricultores do sexo masculino, de idade entre 51 a 76 anos, com baixo nível de escolaridade e em trabalhadores de pequenas propriedades rurais. Em 87% dos entrevistados, os agrotóxicos são utilizados há mais de 10 anos, além de 85% utilizar mais de um tipo de produto, dos quais 81% são de classe toxicológica III e I (medianamente tóxico e extremamente tóxico, respectivamente).

O estudo foi realizado pela mestranda em Desenvolvimento e Políticas Públicas da UFFS – Campus Cerro Largo, Letiane Peccin Ristow, orientada pela professora Iara Denise Endruweit Battisti, e analisou a exposição ocupacional por agrotóxicos como subsídio para execução de políticas públicas. As entrevistas foram feitas entre os meses de dezembro de 2016 a março de 2017, e as questões abordaram dados sociodemográficos, práticas de trabalho relacionadas ao uso de agrotóxicos, sintomas de doenças e associação a agrotóxicos e treinamento para uso seguro de agrotóxicos.

“As medidas de uso seguro são propagadas pela indústria química e legislação em vigor, embora existam estudos que evidenciam sua ineficiência diante da diversidade agrícola e sociocultural entre as regiões brasileiras. Muitas vezes, os cuidados no uso de agrotóxicos ocorrem apenas na aplicação e não nas outras atividades em que há manipulação dessas substâncias, como na aquisição, no transporte, no  armazenamento, na devolução das embalagens vazias e na lavagem das roupas ou equipamentos de proteção individual (EPIs) contaminados”, explica a mestranda.

Segundo a pesquisa, as atividades laborais dos trabalhadores rurais realizadas em acordo com as medidas de uso seguro foram aquisição de agrotóxicos e destino final das embalagens vazias, que estão ligadas à existência de fiscalização. Em contraponto, transporte, armazenamento, preparo e aplicação dos agrotóxicos e lavagem das roupas contaminadas não são realizadas de forma segura pela maioria dos trabalhadores rurais. A não utilização de EPIs foi informada por 69% dos trabalhadores rurais.

A maioria dos trabalhadores rurais afirma ter recebido treinamento para uso de agrotóxicos, que é realizado principalmente pelas empresas comercializadoras de agrotóxicos, cooperativas agrícolas, por meio de palestras, cursos ministrados por agrônomo ou técnico agrícola ou dias de campo. Apesar disso, a metade dos trabalhadores rurais afirma ter dúvidas quanto ao uso seguro de agrotóxicos, evidenciando o desconhecimento sobre riscos à saúde em razão da exposição ocupacional. Referente a sintomas de intoxicação por agrotóxicos, 37 (33%) trabalhadores rurais ou familiares tiveram problemas de saúde como náusea, tontura, dores de cabeça e câncer, que julgaram ser decorrente da exposição a agrotóxicos.

Entretanto, conforme afirma Letiane, “a falta de cuidados na manipulação dos agrotóxicos não deve ser vista como uma negligência dos trabalhadores rurais, mas, sim, como resultado do modelo de produção agrícola hegemônico no país que preconiza o uso de agroquímicos, da falta de políticas públicas para promoção do uso seguro de agrotóxicos, da carência de treinamentos oferecidos por órgãos públicos e da inadequação das medidas de uso seguro nas atividades laborais dos trabalhadores rurais cerro-larguenses”.

A pesquisadora argumenta que seu estudo contribuiu para o reconhecimento da existência de fatores de risco à saúde dos trabalhadores rurais do município e “pode orientar políticas públicas e medidas de intervenção baseadas nos resultados encontrados, as quais devem conter treinamentos sobre uso seguro de agrotóxicos e informações sobre os efeitos nocivos destes à saúde, na medida em que conhecimento é uma forma de empoderamento”, conclui.