Professor e alunas desenvolvem projetos de assistência técnica em Moçambique
Entre os objetivos da pesquisa do professor Murad Vaz está o auxílio ao desenvolvimento de projetos arquitetônicos para entidade que atende soropositivos e tuberculosos

Publicado em: 06 de setembro de 2019 09h09min / Atualizado em: 06 de setembro de 2019 09h09min

Professor da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) – Campus Erechim, Murad Vaz ministrou, entre os dias 29 de julho e 1º de agosto, uma oficina de assistência técnica em arquitetura em Moçambique. A atividade é parte da pesquisa de pós-doutorado que o docente realizou em 2018. O objeto da oficina foi uma nova sede para o Centro Hakumana, entidade localizada em Maputo e que terá uma nova sede em Impaputo – distante da capital aproximadamente 60 km. O Centro Hakumana atende crianças, jovens, adultos e idosos soropositivos e tuberculosos.

A oficina foi organizada pelo professor da UFFS e pelas demais entidades parceiras: as universidades Wuitivi-UniTiva, de Boane, e Eduardo Mondlane (UEM), de Maputo. Também foram parceiros os Arquitetos Sem Fronteira (ASF) e uma pesquisadora da Universidade de Lisboa (Ulisboa).

Ao longo de quatro dias foram realizadas palestras, mesas redondas, trabalho de campo e de criação e projeto em ateliê, tudo assessorado por docentes, pesquisadores, técnicos e comunidade local. No total, 40 discentes das duas universidades desenvolveram propostas de projetos arquitetônicos para a nova sede do Centro Hakumana. No último dia, os trabalhos foram apresentados e discutidos, tendo sido escolhidos alguns para continuidade.

Registro de uma das visitas ao terreno que receberá a nova sede da entidade (Fotos: Arquivo pessoal)

De acordo com o professor Murad, a pesquisa de pós-doutorado foi desenvolvida a partir da UFFS, da Ulisboa e da UEM, tendo como objeto de estudos os espaços públicos de Maputo. “Tive a chance de acompanhar minha supervisora de pesquisa, professora Ines Macamo Raimundo, e dar aulas na Faculdade de Arquitetura e Planejamento Físico da UEM”, conta Murad.

Segundo o docente, buscar as particularidades de países que têm condições semelhantes ao Brasil foi o que o motivou a pesquisar Moçambique. “A ideia foi construir e pesquisar novas abordagens metodológicas, teóricas e conceituais voltadas aos nossos contextos, em detrimento de um conhecimento produzido em centros de pesquisa distantes de nossos cotidianos”, explica.

Pesquisadores de diversas instituições participaram das oficinas desenvolvidas

“As agendas internacionais de pesquisa, bem como seus métodos e teorias, não dão conta de nos explicar, e, ao mesmo tempo, são motivadas pelos mais variados interesses de dominação. Por isso, busco uma abordagem decolonial. Também acho imprescindível estreitar vínculos com Instituições de Ensino Superior para intercâmbio de discentes, técnicos e docentes, diversificando nossos olhares e formas de pensar e fazer – aprendendo e trocando experiências com o outro”, diz Murad.

Conforme o professor, a UFFS, como instituição pública, popular e de qualidade, tem um alto potencial em intervir em sua região, onde as carências socioeconômicas são traduzidas espacialmente. “O Centro Hakumana, pela seriedade e competência no trabalho social que desempenha, ilustra muito bem as diversas possibilidades de atuação de arquitetos e urbanistas. Temos potencial de oferecer assistência técnica altamente qualificada para a arquitetura e para as cidades. Sobretudo àqueles que estão à margem do mercado formal de atuação de arquitetos e urbanistas, no que concerne moradia digna, entre outros diversos projetos necessários”, destaca.

Buscando ampliar as relações internacionais da UFFS, os contatos que o professor Murad construiu ao longo da pesquisa deram outros frutos: Cila Fernanda da Silva e Paula Renata Gresele, duas acadêmicas do curso de Arquitetura e Urbanismo do Campus Erechim, foram trabalhar em Maputo em fevereiro deste ano. Elas foram voluntárias na Associação Iverca, colaboraram com os Arquitetos Sem Fronteiras (ASF) e desenvolveram atividades com o arquiteto moçambicano Remígio Chilaule, como visitas e alguns trabalhos para o Museu da Mafalala. Também tiveram a oportunidade de apresentar o curso da UFFS para a Unitiva, em Boane.

Acadêmicas da UFFS durante ação dos Arquitetos Sem Fronteiras

Paula conta que a experiência foi muito importante, proporcionando o conhecimento profissional em um outro contexto, com demandas diferentes. “Sempre fomos incentivados pelos nossos professores a propor projetos levando em conta o contexto, respeitando o entorno e compreendendo como ele funciona”, destaca. “Vimos Maputo como um espaço que precisava ser humildemente compreendido por nós. Fomos pra lá dispostas a aprender a maneira deles de fazer as coisas, e não impor a nossa. Isso é algo que a UFFS nos ensinou.”

Sua colega, Cila, diz que o trabalho com a Associação Iverca trouxe uma vivência de obra na qual o arquiteto atua mais no canteiro, trabalhando mais próximo do mestre de obras. “Já com os Arquitetos Sem Fronteiras houve toda uma experiência do urbanista em trabalho de campo, em um processo similar a uma regularização fundiária, articulando outros profissionais, o governo e a comunidade”, lembra a acadêmica. “Ainda que durante o curso nós estudamos cidades brasileiras, aprendemos o quão importante é compreender que cada região tem uma história diferente, principalmente em contextos mais precários. Ficou a lição de como é importante buscar coisas para além da graduação, que possam contribuir e auxiliar na nossa formação”, conta.

"Fomos pra lá dispostas a aprender a maneira deles de fazer as coisas, e não impor a nossa", diz uma das alunas

Cila ainda aproveita para agradecer o trabalho do professor Murad. “Agradecemos pela dedicação e articulação dessa jornada, por tudo o que foi transmitido a nós. Seja como professor ou nas pesquisas que orienta, o cuidado e a reflexão sobre cada contexto e cada região estão presentes e, tanto nesse como nos novos projetos em desenvolvimento, a articulação da UFFS com a cidade é um ponto chave.”

O professor Murad segue dando continuidade aos estudos, conforme o projeto de pesquisa “Maputo: Reflexões Compartilhadas”. Ainda no primeiro semestre deste ano, ao lado de Cila e Paula, o docente foi à Associação Recriando a Vida, em Erechim, para apresentar Moçambique para as crianças e adolescentes, discutindo a riqueza cultural dos países africanos. Também está sendo montando, na UFFS, um Programa de Extensão em Assistência Técnica em Arquitetura, que visa atender Erechim e região.